segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

A CARTA:


Fazia sol.

Ele enviou-lhe uma carta escrita á mão com uma caneta preta de tinta permanente que naquele papel branco sujo desenhou letras delicadas e ímpares.

Nela ia o seu perfume, o seu gesto, o seu beijo, o seu sabor, o seu calor e o seu sorriso e bom feitio crónicos.

Ela chegou a casa vestida de beringela e negro depois de um dia agitado de trabalho e, com as chaves brilhantes na mão esquerda, entrou no prédio, atravessou o pátio com chão de mármore branco e abriu a caixa de correio, lá havia apenas um envelope, uma carta, um recado. Não esperou mais, não conseguiu, a curiosidade foi mais pesada. Logo abriu o envelope com as mãos secas e frágeis vindas da rua fria, fez um corte com a esquina do papel e de lá caíram sete pingas de sangue sobre a pedra clara que debaixo dela estava. Com apreço separou o envelope do bilhete, inspirou fundo e desdobrou o fino papel. Ficou incrédula, lá não vinha nada, apenas palavras vazias e sem sentido, chorou...

Houve um erro, uma crise de ciumes exterior, houve troca de cartas e correspondência. Vitória, ex mulher do remetente, apanhara a carta e dela fez cinzas, na sua lareira de tijolo vermelho queimou todos os sentimentos que nela eram transportados, todos os beijos, todos os afectos, todos os pensamentos. O amor morreu ali, queimado na sua sala pequena e infiel, desfez-se em fumo e cinzas, passou de tudo a quase nada.

A única lembrança que ficara, sete pingas de sangue na entrada da sua morada.

Do outro lado da porta da rua, a chuva caia.


Francisco H.M.

3 comentários:

  1. Gosto muito, gosto do teu estilo de escrita, muito objectivo, expressivo e melodramatico.

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  2. obrigado a todos o que me seguem e apreciam o que aqui deixo. :D continuem a visitar e a comentar . é a melhor recompensa

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